No lugar de Lula, Alckmin diz a diplomatas que Brasil foi claro ao condenar terrorismo do Hamas
Petista recupera-se de episódio de labirintite e foi representado por vice-presidente em cerimônia no Itamaraty
Brasília|Ana Isabel Mansur, do R7, em Brasília

O vice-presidente Geraldo Alckmin declarou nesta terça-feira (27), em cerimônia do Dia do Diplomata, que o Brasil “condenou o terrorismo do Hamas de maneira clara”. Alckmin leu o discurso (leia a íntegra abaixo) do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que se recupera de um episódio de labirintite no Palácio da Alvorada, residência oficial da presidência. Devido ao quadro de saúde, o petista não foi ao evento no Palácio do Itamaraty e foi representado pelo vice-presidente.
“Levado às últimas consequências, o apagamento do outro leva a seu extermínio. A guerra em Gaza é um sintoma trágico desse mal. O Brasil condenou o terrorismo do Hamas de maneira clara e contundente. Mas não podemos nos calar ante a carnificina praticada contra civis palestinos, que resultou na morte de milhares de mulheres e crianças inocentes. A comunidade internacional precisa reconhecer o Estado palestino”, destacou Alckmin.
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O atual conflito na Faixa de Gaza foi desencadeado em outubro de 2023, após um ataque do grupo terrorista Hamas a Israel.
No discurso, o vice-presidente também citou a guerra entre Rússia e Ucrânia. “Na Ucrânia, o Brasil se manteve firme na defesa do direito internacional e de uma abordagem que leve em conta as causas profundas desse conflito. Junto com a China, criamos um Grupo de Amigos da Paz, composto por 13 países emergentes, que podem contribuir para uma negociação satisfatória. A única solução é o diálogo entre as partes. Só existe entendimento quando há respeito à pluralidade”, reforçou Alckmin.
O evento no Ministério das Relações Exteriores também marcou a formatura da turma de diplomatas do Instituto Rio Branco de 2024.
Falas de Lula sobre o Hamas
No dia dos atos, Lula afirmou, em uma rede social, ter “ficado chocado com os ataques terroristas”. “Ao expressar minhas condolências aos familiares das vítimas, reafirmo meu repúdio ao terrorismo em qualquer de suas formas”, escreveu, à época.
No entanto, desde então, falas do petista sobre o conflito têm sido criticadas por especialistas e entidades ligadas a Israel. Em fevereiro de 2024, Lula chegou a comparar a ação do exército israelense na Faixa de Gaza com a atuação do governo nazista de Adolf Hitler contra os judeus.
“O que está acontecendo na Faixa de Gaza, com o povo palestino, não existiu em nenhum outro momento histórico. Aliás, existiu quando Hitler decidiu matar os judeus”, declarou.
Em outubro do ano ado, quando os ataques completaram um ano, o governo brasileiro, por meio de nota, relembrou a dia. “Com profundo pesar, a data de hoje marca um ano desde os ataques terroristas do grupo Hamas em Israel. Ao solidarizar-se com a família de todas as vítimas e com o povo israelense, o governo brasileiro reitera seu absoluto repúdio ao recurso ao terrorismo e a todos os atos de violência”, destacou o Executivo.
Discurso de Lula lido por Alckmin nesta terça
Ao longo de quase onze anos como presidente, tive o privilégio de comparecer a quase todas as formaturas de egressos do Instituto Rio Branco.
Com a cerimônia de hoje, cerca de 700 diplomatas já se formaram em meus três mandatos.
Eles correspondem a quase metade dos 1.600 membros do corpo diplomático brasileiro.
Em seus 80 anos de existência, o Instituto Rio Branco contribuiu de forma decisiva para o profissionalismo do serviço exterior brasileiro e foi fundamental para a inserção internacional do país.
Mas o peso da responsabilidade que recai sobre a diplomacia brasileira é hoje maior do que nunca.
Voltei a ser presidente em uma época de negação da política.
Caberá a vocês serem diplomatas em uma era de negação da diplomacia.
Na política, a democracia está em perigo.
O extremismo ameaça as instituições pelas quais Eunice Paiva, homenageada pelos formandos de 2024, e muitos outros lutaram para construir e defender.
Na diplomacia, cresce o unilateralismo.
Grandes potências agem à revelia dos órgãos e das normas criadas coletivamente ao longo de décadas.
Nos planos interno e externo, proliferam tentativas de impor visões de mundo e de sociedade, desconsiderando a diversidade que enriquece a experiência humana.
O desprezo pelas diferenças é um convite à desumanização.
A professora Ana Flávia Magalhães Pinto, paraninfa desta turma, retrata em sua obra o silenciamento da população negra.
Indígenas e mulheres partilham dessa dor.
Migrantes são criminalizados por desejarem uma vida melhor.
Levado às últimas consequências, o apagamento do outro leva a seu extermínio.
A guerra em Gaza é um sintoma trágico desse mal.
O Brasil condenou o terrorismo do Hamas de maneira clara e contundente. Mas não podemos nos calar ante a carnificina praticada contra civis palestinos, que resultou na morte de milhares de mulheres e crianças inocentes.
A comunidade internacional precisa reconhecer o Estado palestino.
Na Ucrânia, o Brasil se manteve firme na defesa do direito internacional e de uma abordagem que leve em conta as causas profundas desse conflito.
Junto com a China, criamos um Grupo de Amigos da Paz, composto por 13 países emergentes, que podem contribuir para uma negociação satisfatória.
A única solução é o diálogo entre as partes.
Só existe entendimento quando há respeito à pluralidade.
Relações de Estado não podem ficar à mercê de diferenças políticas entre os governos.
Esse equívoco contaminou, nos últimos anos, o processo de integração em nossa região.
Dar prioridade ao entorno não é uma escolha, é uma necessidade.
Estradas, ferrovias e linhas de transmissão não têm ideologias.
A circulação de pessoas e de bens a ao largo das desavenças entre governantes.
Reunir os doze presidentes sul-americanos, como fizemos em 2023, tornou-se praticamente impossível.
Mas o Brasil não pode perder do horizonte a revitalização dos órgãos da integração. Precisamos reconstruir a UNASUL e dotar a CELAC de maior institucionalidade.
Em junho, promoveremos a segunda Cúpula Brasil-Caribe.
Se permanecer fragmentada, a região será marginalizada no rearranjo do tabuleiro global.
O Brasil não precisa e não vai escolher lados em disputas geopolíticas.
Os Estados Unidos são uma presença incontornável para a América Latina e para o Brasil.
Os laços entre as sociedades brasileira e americana são robustos.
A parceria com a China, onde acabo de realizar uma segunda visita de Estado, tem imenso potencial transformador.
Nosso diálogo político e sinergias vão impulsionar planos nacionais de transição energética, reindustralização e infraestrutura.
A Ásia como um todo vem-se consolidando como eixo dinâmico da economia global.
Temos no Japão um parceiro de longa data e na Índia um vasto campo inexplorado de colaboração.
Com vários países do Sudeste Asiático, já temos volume de comércio superior ao que possuímos com sócios tradicionais.
A relação com a Europa continua estratégica.
Dentro de alguns dias estarei na França, país importante na construção de uma ordem multipolar.
O acordo Mercosul-União Europeia é um símbolo contra o protecionismo.
Estamos criando uma das maiores áreas de livre comércio do mundo, reunindo mais de 700 milhões de pessoas.
Nossas economias, juntas, representam um PIB de 22 trilhões de dólares.
A defesa dos valores democráticos é, hoje, a mais importante missão que compartilhamos.
Laços históricos conectam o Brasil não só ao continente europeu, mas também ao africano.
Temos com a África uma dívida que só pode ser paga em solidariedade, cooperação e transferência de tecnologia.
Foi com esse espírito que realizamos na semana ada o Segundo Diálogo Brasil-África sobre Segurança Alimentar, e que se encerrou com a visita de Estado do presidente João Lourenço, de Angola.
Em breve, sediaremos, no Rio de Janeiro, a Cúpula dos BRICS.
O BRICS é, hoje, o porta-voz de uma ordem internacional diversa, que já não cabe nos limites estreitos da arquitetura construída em 1945.
Quando a ONU foi fundada, ela contava com apenas 51 membros. Hoje somos 193 nações na organização.
Não é issível que cinco países tornem os demais reféns de suas vontades e interesses.
A prosperidade permanecerá um privilégio de poucos enquanto as vozes do Sul Global não estiverem devidamente representadas no Banco Mundial e no Fundo Monetário Internacional.
Há quem critique o conceito de Sul Global, argumentando que somos muito diferentes entre nós.
Mas países de renda baixa e média continuam na periferia de um sistema que só beneficia o centro.
Os países ricos foram, historicamente, os grandes responsáveis pela mudança do clima, mas serão os mais pobres quem sofrerão o maior impacto.
A noção de justiça climática será crucial na COP30, em Belém.
É preciso lembrar que embaixo de cada árvore há uma pessoa.
É inconcebível que se gastem 2,4 trilhões de dólares por ano com armamentos enquanto existem mais de 730 milhões de pessoas em situação de insegurança alimentar.
A presidência brasileira do G20 deixou como legado a Aliança Global contra a Fome e a Pobreza, que está trabalhando para erradicar esses flagelos de uma vez por todas.
Caras formandas e caros formandos,
O multilateralismo é ferramenta fundamental para que o Brasil atinja seus objetivos nacionais.
Não poderemos falar em justiça tributária sem que haja um entendimento internacional sobre a tributação de super-ricos.
Não conseguiremos coibir violações de direitos em plataformas digitais sem que haja um esforço coletivo para regulá-las.
Não lograremos preservar a Amazônia sem que todos os países façam sua parte para combater o aquecimento global.
O papel de vocês, diplomatas, implica levar para a frente externa as batalhas que travamos internamente.
Precisamos combater o extremismo e as desigualdade lá fora com o mesmo vigor com que lutamos aqui dentro.
Em pouco mais de um mês, nos despedimos do Papa Francisco, do presidente Mujica e do fotógrafo Sebastião Salgado.
O humanismo e a solidariedade que eles representavam são fonte de inspiração para o mundo.
A ciência mostrou recentemente que o Brasil é o país com a maior diversidade genética do mundo.
Sem desconsiderar a história de violência por trás da miscigenação que nos caracteriza, é significativo que o povo brasileiro tenha a pluralidade inscrita em seu DNA.
Em um mundo que está substituindo pontes por muros, é essa a pluralidade que vocês representarão no exterior.
As recentes premiações do cinema brasileiro em festivais internacionais dão prova da vitalidade da cultura nacional e da nossa política audiovisual.
Quero aproveitar essa cerimônia para cumprimentar Fernanda Torres, Walter Salles, Kleber Mendonça, Wagner Moura e todos os que contribuíram para esse feito.
Estou certo de que a turma Eunice Paiva contribuirá para continuar fazendo do Brasil uma força positiva para a humanidade e para o planeta.
Muito obrigado.
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