Barroso defende sistema eleitoral e cita 'recessão democrática'
Presidente do TSE, o ministro questionou declarações do presidente Bolsonaro sobre insegurança do processo eleitoral
Brasília|Lucas Nanini, do R7, em Brasília

Ao abrir a sessão do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) desta quinta-feira (9), o presidente da Corte, Luís Roberto Barroso, declarou que o mundo vive um processo de “recessão democrática” e que teme que isso afete o Brasil. “É nesse clube que nós não queremos que o Brasil faça parte.”
“Vivemos um momento de subversão democrática, que se deu por líderes políticos eleitos pelo voto popular, e que, em seguida, medida por medida, foram destruindo os pilares que sustentam a democracia e pavimentando o caminho para o autoritarismo”, declarou.
Barroso afirmou que o sistema eleitoral brasileiro é seguro e foi atestado por “inúmeros observadores internacionais”. “As urnas eletrônicas brasileiras são totalmente seguras. Em primeiro lugar, elas não entram em rede e não são íveis de o remoto. Podem tentar invadir os computadores do TSE (e obter alguns dados cadastrais irrelevantes), podem fazer ataques de negação de serviço aos nossos sistemas, nada disso é capaz de comprometer o resultado da eleição. A própria urna é que imprime os resultados e os divulga. O código-fonte [das urnas] é aberto aos partidos, à Justiça Eleitoral e à OAB, um ano anos das eleições.”

Ele afirmou que ainda nesta quinta-feira deve anunciar os integrantes da Comissão de Transparência das Eleições, grupo que vai acompanhar todos os os do processo eleitoral para o pleito de 2022.
“É tudo retórica vazia. Hoje em dia, salvo os fanáticos (que são cegos pelo radicalismo) e os mercenários (que são cegos pela monetização da mentira), todas as pessoas de bem sabem que não houve fraude e quem é o farsante nessa história”, disse.
Populismo, extremismo e autoritarismo
O presidente do TSE citou o populismo, o extremismo e o autoritarismo como aspectos que contribuem para aumentar o risco à democracia. Em seguida, ele relacionou esses pontos às críticas que o sistema eleitoral e o Superior Tribunal Federal (STF) têm recebido do presidente Jair Bolsonaro.
“Quando o fracasso bate à porta, o destino é o populismo. O populismo vive de arrumar inimigos para justificar seu fiasco. As estratégias mais com comuns são usar as mídias sociais para comunicação”, afirmou.

O ministro tem sido atacado constantemente pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido), especialmente no debate sobre o voto impresso.
Sobre extremismo, Barroso mencionou campanhas de ódio e de desinformação e o incentivo à invasão ao Congresso Nacional e ao STF. Ele fez um paralelo entre a situação no Brasil e a invasão ao Capitólio, nos Estados Unidos, ocorrida em janeiro deste ano.
“Intolerância, agressividade e ataque às instituições e às pessoas. É a não aceitação do outro, o esforço para desqualificar ou destruir aquele que pensa diferente. O nós contra eles.”
Ao falar sobre autoritarismo, o ministro lembrou das ditaduras da América Latina na segunda metade do século 20. Barroso disse que as novas gerações, que não viveram o período de autoritarismo, são “presas fáceis” de quem prega “saudade de um tempo bom que não houve.
“Uma das estratégias é criar um ambiente de mentiras, quando as pessoas não divergem das opiniões, mas dos fatos, a pós-verdade. As pessoas não identificam essa distopia que estamos vivendo”, declarou.
Resposta a Bolsonaro
O presidente do TSE também respondeu a questionamentos feitos por Jair Bolsonaro sobre uma suposta insegurança do sistema eleitoral brasileiro. Ele reproduziu frases do presidente e em seguida fez apontamentos.
Sobre a fala do presidente da República de que "a alma da democracia é o voto", Barroso disse que "o voto é elemento essencial da democracia representativa”. "Outro elemento igualmente fundamental é o debate público permanente e de qualidade, que permite que todos os cidadãos recebam informações corretas, formem sua opinião e apresentem seus argumentos."

Barroso disse que Quando esse debate é contaminado por discursos de ódio, campanhas de desinformação e teorias conspiratórias infundadas, a democracia é aviltada”, declarou.
Na visão do presidente do TSE, o slogan para o momento brasileiro parece ser: “conhecerás a mentira e a mentira te aprisionará”.
"O sistema é certamente inseguro para quem acha que o único resultado possível é a própria vitória. Como já disse antes, para maus perdedores não há remédio na farmacologia jurídica", disse Barroso.
Barroso declarou que as eleições brasileiras são totalmente limpas, democráticas e auditáveis. "Eu não vou repetir uma vez mais que nunca se documentou fraude, que por esse sistema foram eleitos FHC, Lula, Dilma e Bolsonaro e que há dez camadas de auditoria no sistema."
Ele também disse que a contagem pública manual de votos "é como abandonar o computador e regredir, não à máquina de escrever, mas à caneta-tinteiro. Seria um retorno ao tempo da fraude e da manipulação. Se tentam invadir o Congresso Nacional e o Supremo Tribunal Federal, imagine-se o que não fariam com as seções eleitorais".
Barroso respondeu ao questionamento sobre a população ter dúvidas em relação à lisura do processo eleitoral. Ele citou que o presidente fez campanha contra as urnas eletrônicas durante quase três anos e que por isso "uma minoria de eleitores ou a ter dúvida sobre a segurança do processo eleitoral". "Dúvida criada artificialmente por uma máquina governamental de propaganda. Assim que pararem de circular as mentiras, as dúvidas se dissiparão."

O presidente do TSE também afirmou que o próprio presidente disse ter provas sobre as fraudes na eleição, mas que nunca as mostrou. Barroso citou a live na qual Bolsonaro afirmou que comprovaria a falta de segurança nas eleições. Segundo o ministro, a transmissão "deverá figurar em qualquer futura antologia de eventos bizarros". "[Bolsonaro] foi intimado pelo TSE para cumprir o dever jurídico de apresentar as provas, se as tivesse. Não apresentou."
“Insulto não é argumento. Ofensa não é coragem. A incivilidade é uma derrota do espírito. A falta de compostura nos envergonha perante o mundo. A marca Brasil sofre, nesse momento, uma desvalorização global. Somos vítimas de chacota e de desprezo mundial”, disse.
Para Barroso, essa desvalorização é um “desprestígio maior do que a inflação, do que o desemprego, do que a queda de renda, do que a alta do dólar, do que a queda da bolsa, do que o desmatamento da Amazônia, do que o número de mortos pela pandemia, do que a fuga de cérebros e de investimentos. Mas, pior que tudo, nos diminui perante nós mesmos. Não podemos permitir a destruição das instituições para encobrir o fracasso econômico, social e moral que estamos vivendo”.